João



Ninguém escreve ao coronel. Sua solidão, assim como as suas terras, é vastíssima.
E viver é isso mesmo: Ir-se partindo, perdendo os meios, os inícios. No fim restam ossos e loucura. Coronel ficou louco, dizem. Sonhou com o diabo, até. Mas sonho é sonho, outra coisa que se perde.
Coronel fica espreitando o escuro. Deus nunca responde. Naquela época nem sabia que havia a morte, os frios. Um dia Deus manda recado, sua presença se faz notar, nem que seja numa florzinha, coisinha pequena, até num bicho dá pra ver Deus firme ali, no mato.
Estrada caminhada em silêncio.
Nunca mais viu Mariinha. Também não voltaram a juventude nem a esperança. Viver é ir se perdendo. Estrada que já acaba.
A estrada de Mariinha, seus verdes anos, cheia de risadas, de lua e sol. Saudade imensa.
O coronel fecha-se em bois e silêncios. Essas entranhas ruins. De noite, o seu peito vazio pesa como pesa o nada, o grande peso da ausência, maior que todos os outros.

Escassez


Não tenho nada a oferecer-te:
Alguns relâmpagos de lucidez,
As histórias que impregnam meu corpo,
Meu corpo e suas vontades,
Os sonhos perdidos.

Não tenho nada a oferecer-te:
Um sorriso melancólico,
O tempo que ainda me resta,
O impulso da desistência, 
E ainda uma estrela longínqua no céu, minha idéia do paraíso,
Nossas vidas entrelaçadas.