Eles
já não se viam há seis meses. Mas aí, veio a pandemia de Covid, o isolamento
social, e ele se pegou pensando nela. Ele tinha a desculpa perfeita para uma
reaproximação, o mundo estava acabando, queria saber como ela estava. Soou
educado. Ela não achou. Assim que reconheceu a voz dele do outro lado da linha,
desligou. Mas e se ele estivesse doente? Ligou novamente. Iniciaram um papo.
Combinaram de falar de novo amanhã.
Muita
coisa havia mudado nos seis meses em que estiveram afastados. Ela mudou de
emprego, ele adotou um cachorro. O peixe dela morreu. Ela tinha um peixe?
Tinha, mas comprou depois que já tinham terminado.
-
Qual era o nome do peixe?
-
Saudade.
O
nome do peixe não era saudade. Era Cirilo. Mas ela já tinha tomado algumas
taças de vinho e achou que ficaria bonito dizer aquela palavra. Ele entendeu o
recado. Na ligação seguinte, foi direto ao ponto:
A
partir daí muitas palavras quentes se derramaram. Por muitas horas. Por muitos dias.
E vieram as juras de amor. Nada será como antes.
Acabou
a pandemia. Combinaram de se encontrar. Foram muito felizes por duas semanas.
Até que, exatamente como da última vez, na mesma sorveteria (ah, essas coisas se
repetem) ele fez um comentário sobre um barulho que ela fazia quando tomava
sorvete. O mesmo comentário da briga anterior. Ele nem lembrava. Ela não
admitia, não se fala esse tipo de coisa. Ele não tem respeito pelos outros. Ela
não tem humor. É uma chata. É um grosseiro. É insuportável. Vamos ficar por aqui.
-
Logo agora que podemos nos ver...
-
Pois é. Romeu e Julieta já nos mostraram a força de um amor proibido.
Ele
era professor de literatura inglesa. Ela sorriu. Talvez se tornassem amigos. Na
próxima pandemia.
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