Outro Sonho
O
homem invisível apanhou o seu chapéu invisível e saiu pelas ruas.
A
casa vazia não sente a sua falta.
O
cão invisível desistiu de esperá-lo, ele nunca voltou.
As
montanhas, as pontes, as portas o viram e esqueceram.
Apenas
paredes nuas guardam o seu retrato.
O
homem invisível desfez-se sem ter sido mais que um sonho,
um
sonho que morreu na noite de um homem real.
Mágoa
Toda palavra pode vazar.
Qualquer palavra vai
doer para sempre.
Qualquer palavra seca há
de afogar-me.
Cada palavra será mágoa,
Toda palavra será resto.
Não diga nada, toda
palavra sobra, toda palavra sangra, cada palavra ferve.
Não diga nada, eu pairo
em silêncio e cada palavra será chumbo.
Milagres
Tenho visto milagres:
certos olhares que se não me desvendam a alma (posto que é indevassável), pelo menos a presentificam;
uma criança crescendo;
o tempo passando no meu rosto,
na tinta esmaecendo na parede,
em tudo que é matéria (único habitat do tempo).
São Paulo, 2012
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