Apagão


(Armando está lendo, Helena entra afobada)

- Armando, por quê a tigela de comida do gato estava do lado da planta?

- Não sei, Helena. Provavelmente, eu aguei o gato e alimentei a planta.

- O que está acontecendo, Armando?

- Eu estou confuso, Helena. Não aguento mais ficar preso em casa. Eu já li reli toda a minha coleção de Tesouros da Juventude.

- Me ajude a arrumar a casa.

- Não quero, Helena. Não quero gastar energia com isso.

- Prefere gastar se angustiando, né?

- Talvez! Eu tenho pensado muitas coisas...  Por exemplo, agora há pouco, eu estava pensando que não passamos de uma gigantesca colônia de bactérias. Todos nós.

- Ai, meu Deus, Gustavo.

- Você me chamou de Gustavo?  Você está me traindo, Helena?

- Não! É muito pior. Eu esqueci seu nome.

- Meu nome é Armando, Helena!

- Calma! Eu ando muito nervosa. Já são muitos dias trancados. Eu nem sei mais que dia é hoje.

- Nem eu.

- Deu um apagão.

- Eu sei como é.  Calma. Vem cá. Me abraça.

- Essa pandemia expôs a nossa fragilidade, Armando. A gente não sabe o dia de amanhã.

- Eu te amo.

- Amar é enlouquecer juntos.

- Que bonito isso.

(A luz se apaga)

- O que foi isso?

- Um apagão.

- Armando, você lembrou de  pagar a conta de luz?

- ...

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário